Não soubesse eu ver-te tão transparente
E teria sido apenas
Um encontro acidental
Uma simples vertigem
Dum desporto radical
Carlos Tê, Competência Para Amar
E teria sido apenas
Um encontro acidental
Uma simples vertigem
Dum desporto radical
Carlos Tê, Competência Para Amar
A maior parte das pessoas que acabam por fazer parte da nossa vida entram-nos pela porta dentro sem que dêmos conta. Os dias sucedem-se e, com eles, mais ou menos encontros, quase sempre acidentais. Os grandes amigos, aqueles que guardamos no peito, que resguardamos como peças preciosas ou jardins ocultos onde só nós queremos ser senhores do privilégio de entrada, vieram até nós, as mais das vezes, trazidos pelas vagas do acaso. Os cenários são do mais improvável que a imaginação humana consegue idealizar: mesas de café, semáforos fechados, manifestações de protesto, encontrões em passeios apinhados, aulas absolutamente desinteressantes, casamentos de família e – porque não? – a Internet. E eis senão quando a ponte está lançada, o novelo de lã atirado para o lado de lá e as conversas vão fluindo naturalmente como um longo cachecol que um dia, predizemos, haveremos de usar quando o Inverno for rigoroso cá para os lados da Península Ibérica.
Os encontros acidentais costumam produzir melhores efeitos do que os pormenorizadamente preparados. A quem é que nunca sucedeu conhecer uma pessoa especialíssima – viríamos a descobri-lo mais tarde – num «bad hair day» ou naquele exacto dia em que o almoço deixou como vestígio inocultável uma gigantesca nódoa de vinho na camisa? E, ainda assim, foi precisamente porque tínhamos os cabelos em desalinho ou parecíamos crianças de cinco anos a quem a mãe se esqueceu de pôr o babete que essa pessoa fixou os olhos em nós, nos sorriu e, solícita, se propôs resgatar-nos às gargalhadas mundanas que destruiriam para sempre o nosso ego, convidando-nos para bebermos um copo mais logo, depois do jantar. E depois do copo, novamente, a história do novelo de lã e do cachecol.
As amizades especiais nascem, inúmeras vezes, assim, de encontros acidentais que não esperávamos, nos quais não acreditávamos e que jurávamos a pés juntos serem coisa de argumento "hollywoodesco" ou telenovela da tarde. A verdade é que a vida é, frequentemente, assim mesmo, um guião que não lemos, uma prova para a qual não estávamos preparados, um imenso ponto de interrogação diante dos olhos para o qual não temos resposta porque nem sequer estamos certos de que percebemos bem a pergunta. E, às vezes, com a dose exacta de fortuna e, quem sabe, a conjugação certa de algo que nem sabemos que existe, os resultados são os melhores. Resta a cada um de nós, felizes destinatários da oportunidade que o imprevisto nos deu, fazer bom uso disso.
[Também publicado em PNETcrónicas.]
© Marta Madalena Botelho
Os encontros acidentais costumam produzir melhores efeitos do que os pormenorizadamente preparados. A quem é que nunca sucedeu conhecer uma pessoa especialíssima – viríamos a descobri-lo mais tarde – num «bad hair day» ou naquele exacto dia em que o almoço deixou como vestígio inocultável uma gigantesca nódoa de vinho na camisa? E, ainda assim, foi precisamente porque tínhamos os cabelos em desalinho ou parecíamos crianças de cinco anos a quem a mãe se esqueceu de pôr o babete que essa pessoa fixou os olhos em nós, nos sorriu e, solícita, se propôs resgatar-nos às gargalhadas mundanas que destruiriam para sempre o nosso ego, convidando-nos para bebermos um copo mais logo, depois do jantar. E depois do copo, novamente, a história do novelo de lã e do cachecol.
As amizades especiais nascem, inúmeras vezes, assim, de encontros acidentais que não esperávamos, nos quais não acreditávamos e que jurávamos a pés juntos serem coisa de argumento "hollywoodesco" ou telenovela da tarde. A verdade é que a vida é, frequentemente, assim mesmo, um guião que não lemos, uma prova para a qual não estávamos preparados, um imenso ponto de interrogação diante dos olhos para o qual não temos resposta porque nem sequer estamos certos de que percebemos bem a pergunta. E, às vezes, com a dose exacta de fortuna e, quem sabe, a conjugação certa de algo que nem sabemos que existe, os resultados são os melhores. Resta a cada um de nós, felizes destinatários da oportunidade que o imprevisto nos deu, fazer bom uso disso.
[Também publicado em PNETcrónicas.]
© Marta Madalena Botelho