João Aguardela e Sandra Baptista.
A capa do álbum «E Agora?» [1993], dos Sitiados.
A capa do álbum «E Agora?» [1993], dos Sitiados.
Só ontem se soube que no Domingo, 19 de Janeiro de 2009, morreu o João Aguardela, instrumentista, compositor, letrista, 39 anos (nasceu em Fevereiro de 1969).
Recordo-me das primeiras vezes em que ouvi os Sitiados, das suas primeiras canções, dos cabelos compridos do João. Passei a acompanhar de perto a banda, absolutamente original no panorama musical português. Na altura, a minha irmã usava o mesmo penteado que a Sandra Baptista e também tocava acordeão. Eu andava a experimentar o instrumento, mas o Fratelli Pigini onde me aventurava (com 120 baixos e sete registos à terceira voz) era demasiado pesado para mim. Nunca alcancei grande destreza, toco umas coisas, umas coisinhas, vá. Agora repousa na prateleira de um dos móveis da sala da casa dos meus avós, como tantas e tantas coisas pelas quais me desinteressei ou para as quais o tempo - provavelmente porque dele faço péssima gestão - não chega.
Entretanto apareceram outras bandas, o João cortou o cabelo, a minha irmã e a Sandra mudaram de penteado e os Sitiados, tal como o acordeão de lá de casa, calaram-se. Aguardela regressou mais tarde com Megafone, um projecto fantástico que na época me cativou de modo especial, já que andava fascinada pela História da Música, a Etnomusicologia, a Organologia e as outras Ciências Musicais que quase passaram a perna ao Direito. Recordo-me de ouvir o João Aguardela e o Paulo Bragança falarem de Michel Giacometti, um nome que eu só ouvira referido pelos meus professores do Conservatório, numa entrevista televisiva. Com o Paulo Bragança cheguei a cruzar-me numa discoteca, no tempo em que se usavam os olhos contornados com eyeliner preto, quanto mais melhor. Com o Aguardela quis muito cruzar-me em 2006, num concerto d'A Naifa, o seu último projecto, mas acabei por não ir, pensando que haveria outra oportunidade. Não houve. A última vez que ouvi A Naifa foi em Agosto do ano passado, já ele estava retirado.
Um pouco por toda a parte se disse e se escreveu que no Domingo morreu o João Aguardela, demasiado jovem, demasiado talentoso, demasiado invulgar, mas faltou dizer isto: o cancro, silencioso e fatal, é a mais sacana (o termo inicial era outro, mais agreste e menos polido) das doenças. Já levou alguns dos que me eram queridos, haverá de levar muitos mais, quem sabe até a mim. Desta feita, calhou a fava ao João Aguardela: não estava outro parvo no seu lugar.
[Também publicado em PnetCrónicas]
© Marta Madalena Botelho
Recordo-me das primeiras vezes em que ouvi os Sitiados, das suas primeiras canções, dos cabelos compridos do João. Passei a acompanhar de perto a banda, absolutamente original no panorama musical português. Na altura, a minha irmã usava o mesmo penteado que a Sandra Baptista e também tocava acordeão. Eu andava a experimentar o instrumento, mas o Fratelli Pigini onde me aventurava (com 120 baixos e sete registos à terceira voz) era demasiado pesado para mim. Nunca alcancei grande destreza, toco umas coisas, umas coisinhas, vá. Agora repousa na prateleira de um dos móveis da sala da casa dos meus avós, como tantas e tantas coisas pelas quais me desinteressei ou para as quais o tempo - provavelmente porque dele faço péssima gestão - não chega.
Entretanto apareceram outras bandas, o João cortou o cabelo, a minha irmã e a Sandra mudaram de penteado e os Sitiados, tal como o acordeão de lá de casa, calaram-se. Aguardela regressou mais tarde com Megafone, um projecto fantástico que na época me cativou de modo especial, já que andava fascinada pela História da Música, a Etnomusicologia, a Organologia e as outras Ciências Musicais que quase passaram a perna ao Direito. Recordo-me de ouvir o João Aguardela e o Paulo Bragança falarem de Michel Giacometti, um nome que eu só ouvira referido pelos meus professores do Conservatório, numa entrevista televisiva. Com o Paulo Bragança cheguei a cruzar-me numa discoteca, no tempo em que se usavam os olhos contornados com eyeliner preto, quanto mais melhor. Com o Aguardela quis muito cruzar-me em 2006, num concerto d'A Naifa, o seu último projecto, mas acabei por não ir, pensando que haveria outra oportunidade. Não houve. A última vez que ouvi A Naifa foi em Agosto do ano passado, já ele estava retirado.
Um pouco por toda a parte se disse e se escreveu que no Domingo morreu o João Aguardela, demasiado jovem, demasiado talentoso, demasiado invulgar, mas faltou dizer isto: o cancro, silencioso e fatal, é a mais sacana (o termo inicial era outro, mais agreste e menos polido) das doenças. Já levou alguns dos que me eram queridos, haverá de levar muitos mais, quem sabe até a mim. Desta feita, calhou a fava ao João Aguardela: não estava outro parvo no seu lugar.
[Também publicado em PnetCrónicas]
© Marta Madalena Botelho