A novela começou no dia 2 de Maio, um sábado soalheiro, com a publicação de uma reportagem no jornal «Público», onde o presidente do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos, José Marques Teixeira, afirmou que um psiquiatra poderia dar resposta a um homossexual que lhe pedisse ajuda médica para mudar de orientação sexual. Em síntese, dizia que era possível alterar, no sentido de curar, a orientação sexual de alguém.
No seguimento desta notícia, várias organizações solicitaram ao bastonário da Ordem dos Médicos que se pronunciasse sobre o assunto. O psiquiatra Daniel Sampaio, por sua vez, escreveu, uma semana mais tarde, uma crónica na revista Pública tecendo ferozes críticas às palavras de José Marques Teixeira e deu início a uma petição, exigindo também uma clarificação por parte da cúpula da Ordem e do Colégio da Especialidade de Psiquiatria sobre o que fora noticiado.
Uns dias mais tarde, a 14 de Maio, o bastonário respondeu por escrito às organizações dizendo, entre outras coisas, que a orientação sexual não é uma doença (1). A seguir, o bastonário defende a liberdade de qualquer pessoa para aceitar ou negar a sua orientação sexual e procurar o auxílio de um médico quando a sua sexualidade lhe causar sofrimento. O médico deveria, então, ajudá-lo a definir a orientação que pretende. Luís Nunes remata dizendo que a alteração da orientação sexual de um doente não constitui uma violação ética. Esqueceu-se foi de discorrer sobre o facto de ser possível fazê-lo.
A mim o assunto parece-me tão simples quanto isto: sequer equacionar que se possa reverter, tratar, curar (ou qualquer outra expressão com significado semelhante) a orientação sexual homossexual implica pressupor que se trata de uma doença. Aliás, considerar a elaboração de um plano terapêutico e de um acompanhamento médico com o único propósito de modificar a orientação sexual de alguém, como fez o bastonário, é tratar essa característica como se fosse uma patologia. Todavia, já há muito se concluiu que não é doença, não é patologia, logo, não é curável nem passível de nenhuma intervenção como aquela que é subentendida das palavras do bastonário e do presidente do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos, cuja posição não pode senão causar a maior das estupefacções.
Já a ignorância, essa, é susceptível de tratamento. Dizem que com umas leituras e com um bocadinho de decência intelectual a coisa vai. É só mesmo uma questão de querer.
Marta Botelho
(1) «A APA (American Psychiatric Association) retirou a homossexualidade do seu «Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais» (DSM) em 1973, depois de rever estudos e provas que revelavam que a homossexualidade não se enquadra nos critérios utilizados na categorização de doenças mentais. Psicólogos e sexólogos chegaram à conclusão de que a homossexualidade é uma variante sexual normal.» (v. SILVA, Rita – «O que é a homossexualidade», in Homofobia: Causas e Consequências. Versão electrónica em http://homofobia.com.sapo.pt).
[Sugestão: ler ao som de «Fuck You», de Lily Allen, do álbum «It's not me, it's you» (2009).]
No seguimento desta notícia, várias organizações solicitaram ao bastonário da Ordem dos Médicos que se pronunciasse sobre o assunto. O psiquiatra Daniel Sampaio, por sua vez, escreveu, uma semana mais tarde, uma crónica na revista Pública tecendo ferozes críticas às palavras de José Marques Teixeira e deu início a uma petição, exigindo também uma clarificação por parte da cúpula da Ordem e do Colégio da Especialidade de Psiquiatria sobre o que fora noticiado.
Uns dias mais tarde, a 14 de Maio, o bastonário respondeu por escrito às organizações dizendo, entre outras coisas, que a orientação sexual não é uma doença (1). A seguir, o bastonário defende a liberdade de qualquer pessoa para aceitar ou negar a sua orientação sexual e procurar o auxílio de um médico quando a sua sexualidade lhe causar sofrimento. O médico deveria, então, ajudá-lo a definir a orientação que pretende. Luís Nunes remata dizendo que a alteração da orientação sexual de um doente não constitui uma violação ética. Esqueceu-se foi de discorrer sobre o facto de ser possível fazê-lo.
A mim o assunto parece-me tão simples quanto isto: sequer equacionar que se possa reverter, tratar, curar (ou qualquer outra expressão com significado semelhante) a orientação sexual homossexual implica pressupor que se trata de uma doença. Aliás, considerar a elaboração de um plano terapêutico e de um acompanhamento médico com o único propósito de modificar a orientação sexual de alguém, como fez o bastonário, é tratar essa característica como se fosse uma patologia. Todavia, já há muito se concluiu que não é doença, não é patologia, logo, não é curável nem passível de nenhuma intervenção como aquela que é subentendida das palavras do bastonário e do presidente do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos, cuja posição não pode senão causar a maior das estupefacções.
Já a ignorância, essa, é susceptível de tratamento. Dizem que com umas leituras e com um bocadinho de decência intelectual a coisa vai. É só mesmo uma questão de querer.
Marta Botelho
(1) «A APA (American Psychiatric Association) retirou a homossexualidade do seu «Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais» (DSM) em 1973, depois de rever estudos e provas que revelavam que a homossexualidade não se enquadra nos critérios utilizados na categorização de doenças mentais. Psicólogos e sexólogos chegaram à conclusão de que a homossexualidade é uma variante sexual normal.» (v. SILVA, Rita – «O que é a homossexualidade», in Homofobia: Causas e Consequências. Versão electrónica em http://homofobia.com.sapo.pt).
[Sugestão: ler ao som de «Fuck You», de Lily Allen, do álbum «It's not me, it's you» (2009).]