Sete e meia da manhã, dia de semana. Entro numa pastelaria na companhia de uma Amiga para experimentar uns famosos croissants da terra. Numa mesa, dois rapazes, provavelmente na década dos 20, visivelmente ainda sob o efeito do álcool ingerido madrugada fora.
Dirijo-me de imediato ao WC para lavar as mãos. Enquanto isso, ouço os dois sujeitos a tentar entabular conversa com a minha Amiga que, muito bem disposta, remata o assunto dizendo logo que nós não somos dali, que somos do Algarve. Um deles, aproveita logo para dizer à minha Amiga que a avó dele sempre lhe disse que ele era «uma riqueza». «Uma riqueza», repetia ela às gargalhadas quando me contou isto que eu já não ouvi.
Eu regresso à mesa. A minha Amiga levanta-se e é a vez dela de ir ao WC. Os dois totós desatam, então, a falar daquilo que conheciam sobre o Algarve, enquanto eu vou acenando pacientemente com a cabeça como se estivesse a sorver cada uma das suas palavras, fazendo apelo ao meu «lado Madre Teresa de Calcutá». É então que um dos sujeitos se levanta, vem ao pé de mim e pergunta se somos de Portimão. A minha Amiga, entretanto regressada, responde: «Qual Portimão! Somos de Faro!» e eu, completamente a leste do que ela lhes havia dito mais sobre nós enquanto eu estivera ausente, limito-me a sorrir.
O sujeito diz que Faro é uma terra linda, onde se pode ver isto e aquilo e que já lá esteve algumas vezes a passar férias e mais não sei o quê. A minha Amiga entra na brincadeira e fala-lhe da Ilha. Ele diz logo que já lá esteve. Eu continuo a sorrir, pensando já só nos elogiados croissants que em breve nos serão servidos.
Eis senão quando o tipo que está em pé me pergunta o meu nome. Eu, que não tenho queda para a mentira nem estou habituada a ter de lidar com estes marmelos logo de manhã, respondo «Marta». O outro fulano, sentado na outra mesa, pergunta «Marta quê?». Surpreendida pela questão, esbugalho os olhos e ele acrescenta «Sim, Marta é o primeiro, mas o último, como é o teu último nome?». Eu, feita parva, em vez de dizer «Silva» ou «Costa» ou outra coisa qualquer, digo mesmo «Botelho», enquanto a minha Amiga se ri e acha imensa graça à situação e me pergunta se eu não podia ter inventado um nome qualquer.
Entretanto, entra na pastelaria um amigo dos dois sujeitos e diz-lhes que paguem a conta para irem embora, que ele já ali está e tem o carro mal parado. O tipo que estava sentado pergunta-me se, por acaso, eu não quero dar-lhe o meu número de telemóvel. Eu sorrio e respondo «Claro que não». Ele pergunta se eu quero o dele e leva com a mesma explícita resposta.
É então que o tipo que estava em pé, junto à nossa mesa, se volta para mim e pede que olhe para ele, o que, meio-contrariada, lá faço. E sai-se com esta: «Marta Botelho, eu sou o Nuno [qualquer coisa que eu não percebi]. Fixa o meu nome, Marta Botelho. Sou o Nuno [outra vez o sobrenome que eu não percebi]. Fixa bem o meu nome, Marta Botelho, porque o meu nome ainda te vai dar muitas alegrias».
E foram-se embora. Eu e a minha Amiga ficámos atónitas com a situação [ela, obviamente, aproveitando-se da mesma para troçar de mim às gargalhadas e me lembrar que o rapaz era «uma riqueza», porque a avó dele lhe estava sempre a dizer que ele era «uma riqueza»]. Finalmente, lá vieram os afamados croissants e não houve mais conversa, só mesmo tempo para os devorar, deliciosos que são.
Nunca me tinha acontecido tal, mas bem diz o povo que «há sempre uma vez para tudo». A única coisa que me preocupa verdadeiramente, é que, pelos vistos, o tal «Nuno» ainda me vai dar muitas alegrias e eu nem sequer sei o sobrenome dele. Enfim, resta-me a esperança de que ele, que sabe o meu nome e o meu sobrenome, venha ao meu encontro para me mostrar que alegrias serão essas. Em todo o caso, sempre me fica uma hilariante história para contar aos netos: as coisas que podem acontecer-nos nas pastelarias daquela terra às sete e meia da manhã de um dia de semana.
© [m.m. botelho]
Dirijo-me de imediato ao WC para lavar as mãos. Enquanto isso, ouço os dois sujeitos a tentar entabular conversa com a minha Amiga que, muito bem disposta, remata o assunto dizendo logo que nós não somos dali, que somos do Algarve. Um deles, aproveita logo para dizer à minha Amiga que a avó dele sempre lhe disse que ele era «uma riqueza». «Uma riqueza», repetia ela às gargalhadas quando me contou isto que eu já não ouvi.
Eu regresso à mesa. A minha Amiga levanta-se e é a vez dela de ir ao WC. Os dois totós desatam, então, a falar daquilo que conheciam sobre o Algarve, enquanto eu vou acenando pacientemente com a cabeça como se estivesse a sorver cada uma das suas palavras, fazendo apelo ao meu «lado Madre Teresa de Calcutá». É então que um dos sujeitos se levanta, vem ao pé de mim e pergunta se somos de Portimão. A minha Amiga, entretanto regressada, responde: «Qual Portimão! Somos de Faro!» e eu, completamente a leste do que ela lhes havia dito mais sobre nós enquanto eu estivera ausente, limito-me a sorrir.
O sujeito diz que Faro é uma terra linda, onde se pode ver isto e aquilo e que já lá esteve algumas vezes a passar férias e mais não sei o quê. A minha Amiga entra na brincadeira e fala-lhe da Ilha. Ele diz logo que já lá esteve. Eu continuo a sorrir, pensando já só nos elogiados croissants que em breve nos serão servidos.
Eis senão quando o tipo que está em pé me pergunta o meu nome. Eu, que não tenho queda para a mentira nem estou habituada a ter de lidar com estes marmelos logo de manhã, respondo «Marta». O outro fulano, sentado na outra mesa, pergunta «Marta quê?». Surpreendida pela questão, esbugalho os olhos e ele acrescenta «Sim, Marta é o primeiro, mas o último, como é o teu último nome?». Eu, feita parva, em vez de dizer «Silva» ou «Costa» ou outra coisa qualquer, digo mesmo «Botelho», enquanto a minha Amiga se ri e acha imensa graça à situação e me pergunta se eu não podia ter inventado um nome qualquer.
Entretanto, entra na pastelaria um amigo dos dois sujeitos e diz-lhes que paguem a conta para irem embora, que ele já ali está e tem o carro mal parado. O tipo que estava sentado pergunta-me se, por acaso, eu não quero dar-lhe o meu número de telemóvel. Eu sorrio e respondo «Claro que não». Ele pergunta se eu quero o dele e leva com a mesma explícita resposta.
É então que o tipo que estava em pé, junto à nossa mesa, se volta para mim e pede que olhe para ele, o que, meio-contrariada, lá faço. E sai-se com esta: «Marta Botelho, eu sou o Nuno [qualquer coisa que eu não percebi]. Fixa o meu nome, Marta Botelho. Sou o Nuno [outra vez o sobrenome que eu não percebi]. Fixa bem o meu nome, Marta Botelho, porque o meu nome ainda te vai dar muitas alegrias».
E foram-se embora. Eu e a minha Amiga ficámos atónitas com a situação [ela, obviamente, aproveitando-se da mesma para troçar de mim às gargalhadas e me lembrar que o rapaz era «uma riqueza», porque a avó dele lhe estava sempre a dizer que ele era «uma riqueza»]. Finalmente, lá vieram os afamados croissants e não houve mais conversa, só mesmo tempo para os devorar, deliciosos que são.
Nunca me tinha acontecido tal, mas bem diz o povo que «há sempre uma vez para tudo». A única coisa que me preocupa verdadeiramente, é que, pelos vistos, o tal «Nuno» ainda me vai dar muitas alegrias e eu nem sequer sei o sobrenome dele. Enfim, resta-me a esperança de que ele, que sabe o meu nome e o meu sobrenome, venha ao meu encontro para me mostrar que alegrias serão essas. Em todo o caso, sempre me fica uma hilariante história para contar aos netos: as coisas que podem acontecer-nos nas pastelarias daquela terra às sete e meia da manhã de um dia de semana.
© [m.m. botelho]