Tenho uma amiga que diz que, ao longo da vida, nós acabamos por encontrar aquilo que nos completa, porque, ainda que inconscientemente, estamos a enviar para o Universo energias que transmitem aquilo de que precisamos. Explicando melhor: segundo a minha Amiga, mais tarde ou mais cedo, o que nos completa acaba por vir ao nosso encontro, atraído pelas nossas energias, que, no fundo, funcionam como mensagens invisíveis e indecifráveis que só na conjuntura universal se desvelam.
Que a imagem é poética, lá isso é, mas não sei se será verdade ou não. Todavia, também é certo que a mim não me interessa particularmente saber «o que é a verdade» (deixo isso para o Pilatos). O que interessa é que o que esta minha Amiga me diz me faz todo o sentido e, por isso, dou-lhe razão no que afirma.
Olhando para a minha vida, vejo que nunca procurei fosse o que fosse e não foi por isso que deixaram de me acontecer coisas, muitas coisas, boas e más. Sei o que quero - isto é, o que gostaria de encontrar - mas acredito que é essa a mensagem que eu, através das minhas energias, lanço para o Universo. Logo, acredito que o que eu quero é exactamente aquilo que virá ter comigo. E, olhando para trás, vejo que tudo o que eu desejei com enorme determinação e vontade, acabou por vir ao meu encontro. Também é verdade que algumas coisas que eu não desejei (e que, portanto, não queria) me aconteceram, mas talvez isso faça parte da dinâmica da própria vida, onde não há almoços grátis.
No que respeita aos amores, em particular, nunca desejei coisa nenhuma. Às vezes, ouvia as minhas Amigas ou Colegas comentarem que tinham feito um pedido a Santo António, para que lhes trouxesse ao caminho um rapaz assim ou assado. E quem diz a Santo António, diz a outra entidade qualquer, quem diz rezando diz fazendo outra coisa qualquer que há muita maneira de caçar pulgas e de fazer pedidos, então, ainda deve haver mais. Já eu, nunca pedi coisa alguma. Nunca quis, em nenhum momento da minha vida, encontrar propositadamente alguém. Não tenho medo algum de estar sozinha e, para mim, é ridículo estar a fazer pedidos no sentido de que me seja enviada uma cara-metade ou de que alguém por quem nutro afecto se apaixone perdida e loucamente por mim. Respeito que os outros o façam, porque cada um faz o que quer, mas para mim seria ridículo sequer conjecturá-lo.
No entanto, isto não quer dizer que, de forma inconsciente, eu não esteja, como diz a minha Amiga, a enviar as minhas mensagens energéticas codificadas para o Universo. Na realidade, devo estar mesmo, porque é um facto que as coisas me acontecem, isto é, que as pessoas me saem ao caminho, que à minha vida nunca faltaram encontros, mesmo que eu nunca tenha procurado ou desejado ninguém.
É por isso, certamente, que nunca vi como necessário pedir fosse o que fosse. A acreditar numa frase que a minha querida Mãe, enquanto me afaga os cabelos e me dá beijinhos na testa, me diz quando me vê lidar com um fracasso, «o que é meu às minhas mãos haverá de vir parar». Ora, se algo não me vem parar às mãos ou vem mas vai embora, é porque não tinha de ser meu, pelo menos não naquele momento (no primeiro caso) ou não para além daquele momento (no segundo).
Sendo assim, eu lamento sempre que há um desencontro na minha vida, mas não me deixo enredar no desespero de achar que estou a perder seja o que for. Não estou a perder absolutamente nada, pois estou a deixar o Universo seguir o seu curso. Se custa e dói? Claro que sim! Imenso! Mas é precisamente para isso que somos equipados com uma característica chamada resiliência, que devemos trabalhar o mais possível para facilitarmos a nossa própria vida o mais possível, também. Nada é certo ou seguro ao longo da nossa existência (a não ser a nossa finitude) e ter a capacidade de sobreviver às desgraças que nos vão sucedendo é fundamental para resistir sem nos transformarmos em parvinhos que só dizem e fazem disparates, achando que só eles é que sofrem e só eles é que têm de pagar almoços na vida. Temos todos: isto é tramadinho para toda a gente.
Ao invés, mais vale deixar as coisas levarem o seu curso natural, acreditar que o que nos estiver destinado às nossas mãos haverá de vir parar porque nós não estamos parados, amorfos, à espera do que nos aconteça. Não: nós estamos, ainda que inconscientemente, a enviar mensagens energéticas para o Universo, dizendo o que nos completa e algures, lá no meio das constelações, a mensagem haverá de ser decifrada e a nossa metade haverá de vir ao nosso encontro com toda a placidez do Mundo. Deve ser por isso que o povo diz que «cada um só tem o que merece»: porque o que nos acontece é o que nós provocamos com os nossos pedidos, ainda que inconscientes.
O que às vezes sucede é que alguns de nós são danos colaterais dos pedidos dos outros, mas é mesmo assim: viver e criar laços é assumir a eventualidade de sermos um dano colateral. Quando o somos, é tremendo, avassalador, sufocante, mas se tivermos a resiliência suficiente para lhe sobreviver, é maravilhoso, porque aprendemos com isso e tornamo-nos, provavelmente, mais humanos e mais maturos. E essa é que é a piada toda de viver. Essa é que é a única vantagem que advém de pagar tantos almoços ao longo da vida.
[Nota: Este texto foi impulsionado pela imagem que o acompanha e que diz «Eu não procuro. Eu encontro.». Calha bem, porque eu também.]
© [m.m. botelho]