Apesar de estarmos praticamente na recta final do mês de Julho, aqui pelo Norte hoje está um daqueles dias taciturnos, mais convidativos ao silêncio do que ao burburinho da areia coberta de toalhas coloridas ou das esplanadas repletas de gente. Está um dia tão calmo que de vez em quando, apenas um murmúrio, um rugido de onda interrompe o sossego que me tem prendido ao livro que estou a ler.
Por isso, hoje os meus vizinhos também escolheram a tranquilidade das suas casas. Olhando em frente vejo que o filho mais novo está, como sempre, agarrado ao computador enquanto o pai preguiça no sofá da sala. Na janela ao lado, uma rapariga com um gato preto deitado no colo esforça-se por pintar as unhas dos pés sem o acordar.
Até os pássaros estão calados. Esvoaçam de cá para lá no céu cinzento, alguns pousam nos fios eléctricos, mas nem piam entre si. As gaivotas hoje estão em terra e de vez em quando também passam por aqui. A tarde ameaça chuva.
Se pudesse e o tempo a isso convidasse, estaria, obviamente, a passear junto ao mar. Gosto de caminhar pela linha da praia e ver como as janelas das casas do outro lado da rua se abrem uma a uma, algumas ainda timidamente, para deixarem entrar a luz do sol reflectida num imenso manto azul e frio. Mas hoje não há sol e o dia também não está suficientemente quente para me fazer trocar os sapatos pelas Havaianas. Resta-me ficar aqui por casa e imaginar a espuma a beijar-me os pés, os recortes da ondulação na areia, os meus olhos a afundarem-se no abismo marítimo.
Às vezes, sinto que o mundo poderia muito bem ser do tamanho de um metro quadrado, desde que esse metro quadrado fosse ao pé da praia. E dou graças por poder usufruir diariamente do cheiro da maresia e da serenidade do repetitivo vaivém das ondas. Imagino que o Paraíso seja algo de muito semelhante a isto: areia a perder de vista e um manto salgado ao fundo. E questiono-me sobre o que terei feito para merecer lograr um pedacinho de Céu em plena Terra.
[Também publicado em PNETmulher.]
© Marta Madalena Botelho
Por isso, hoje os meus vizinhos também escolheram a tranquilidade das suas casas. Olhando em frente vejo que o filho mais novo está, como sempre, agarrado ao computador enquanto o pai preguiça no sofá da sala. Na janela ao lado, uma rapariga com um gato preto deitado no colo esforça-se por pintar as unhas dos pés sem o acordar.
Até os pássaros estão calados. Esvoaçam de cá para lá no céu cinzento, alguns pousam nos fios eléctricos, mas nem piam entre si. As gaivotas hoje estão em terra e de vez em quando também passam por aqui. A tarde ameaça chuva.
Se pudesse e o tempo a isso convidasse, estaria, obviamente, a passear junto ao mar. Gosto de caminhar pela linha da praia e ver como as janelas das casas do outro lado da rua se abrem uma a uma, algumas ainda timidamente, para deixarem entrar a luz do sol reflectida num imenso manto azul e frio. Mas hoje não há sol e o dia também não está suficientemente quente para me fazer trocar os sapatos pelas Havaianas. Resta-me ficar aqui por casa e imaginar a espuma a beijar-me os pés, os recortes da ondulação na areia, os meus olhos a afundarem-se no abismo marítimo.
Às vezes, sinto que o mundo poderia muito bem ser do tamanho de um metro quadrado, desde que esse metro quadrado fosse ao pé da praia. E dou graças por poder usufruir diariamente do cheiro da maresia e da serenidade do repetitivo vaivém das ondas. Imagino que o Paraíso seja algo de muito semelhante a isto: areia a perder de vista e um manto salgado ao fundo. E questiono-me sobre o que terei feito para merecer lograr um pedacinho de Céu em plena Terra.
[Também publicado em PNETmulher.]
© Marta Madalena Botelho