Há dias, entre amigos, discutia-se culinária. Para além de termos chegado à conclusão de que mais de 50% de nós mal sabiam cozinhar algo para além de ovos mexidos, cedo percebemos também que se há matéria na qual vale a pena discutir os gostos, essa matéria é a comida. Do peixe à carne, passando pelos pratos vegetarianos, havia entusiastas um pouco de tudo: do bacalhau com natas à posta à mirandesa, passando pelo coelho à caçador e pelo arroz de lampreia, para acabar na salada de brócolos com tofu. Porém, num aspecto havia unanimidade: todos – mesmo os (agora) vegetarianos –, gostávamos de francesinha.
Outros há, contudo, que não percebem o fascínio deste delicioso prato e que, para além de o considerarem uma espécie de bomba calórica, criticam a mistura de sabores fortes, principalmente o dos enchidos com o da carne vermelha. Como grande apreciadora da francesinha que assumo ser, discordo bastante deste ponto de vista, claro. Se comparada, por exemplo, com o tradicional cozido à portuguesa ou com uma feijoada bem composta, a francesinha é quase um produto dietético, mesmo que submersa em molho e rodeada de batatas fritas. E não me parece que venha grande mal ao mundo por se tratar de uma sanduíche pois, nesse caso, que diríamos dos deliciosos ensopados alentejanos, das açordas, das migas de broa e grelos e de todos os pratos cuja confecção inclui pão?
É comum ver maior resistência aos encantos da francesinha em quem não é do Norte do país. Talvez não seja por acaso. Para se apreciar devidamente uma boa porção de carne vermelha, salsicha fresca, linguiça, galantine, mortadela, pão, queijo e molho (que, para muitos, constitui o principal segredo), talvez seja necessário crescer a ver francesinhas a boiar em pratos de barro acabados de sair do forno, talvez seja essencial um certo traquejo para cortar verticalmente a sanduíche sem a desfazer, talvez seja imprescindível uma boa dose de descontracção para suportar o risco de deixar os lábios a pingar o afamado molho enquanto, regaladamente, se mastiga um belo naco da iguaria.
Aos que não são apreciadores, bem como aos que nunca experimentaram uma francesinha, proponho que, por uma vez, dêem o benefício da dúvida a um dos cartões de visita da restauração portuense sem receio das calorias nem das nódoas. Afinal de contas, o que importa é a satisfação de degustar um prato rico de sabores e de texturas e o prazer de partilhar bons momentos em torno dele, que o resto os ginásios e as lavandarias se encarregarão de apagar.
nota: os textos são da inteira responsabilidade do cronista
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, cedência, difusão, distribuição, armazenagem ou modificação, total ou parcial, por qualquer forma ou meio electrónico, mecânico ou fotográfico deste texto sem o consentimento prévio e expresso do autor. Exceptuam-se a esta interdição os usos livres autorizados pela legislação aplicável, nomeadamente, o direito de citação, desde que claramente identificada a autoria e a origem.
[Também publicado em PnetCrónicas.]
© Marta Madalena Botelho
Outros há, contudo, que não percebem o fascínio deste delicioso prato e que, para além de o considerarem uma espécie de bomba calórica, criticam a mistura de sabores fortes, principalmente o dos enchidos com o da carne vermelha. Como grande apreciadora da francesinha que assumo ser, discordo bastante deste ponto de vista, claro. Se comparada, por exemplo, com o tradicional cozido à portuguesa ou com uma feijoada bem composta, a francesinha é quase um produto dietético, mesmo que submersa em molho e rodeada de batatas fritas. E não me parece que venha grande mal ao mundo por se tratar de uma sanduíche pois, nesse caso, que diríamos dos deliciosos ensopados alentejanos, das açordas, das migas de broa e grelos e de todos os pratos cuja confecção inclui pão?
É comum ver maior resistência aos encantos da francesinha em quem não é do Norte do país. Talvez não seja por acaso. Para se apreciar devidamente uma boa porção de carne vermelha, salsicha fresca, linguiça, galantine, mortadela, pão, queijo e molho (que, para muitos, constitui o principal segredo), talvez seja necessário crescer a ver francesinhas a boiar em pratos de barro acabados de sair do forno, talvez seja essencial um certo traquejo para cortar verticalmente a sanduíche sem a desfazer, talvez seja imprescindível uma boa dose de descontracção para suportar o risco de deixar os lábios a pingar o afamado molho enquanto, regaladamente, se mastiga um belo naco da iguaria.
Aos que não são apreciadores, bem como aos que nunca experimentaram uma francesinha, proponho que, por uma vez, dêem o benefício da dúvida a um dos cartões de visita da restauração portuense sem receio das calorias nem das nódoas. Afinal de contas, o que importa é a satisfação de degustar um prato rico de sabores e de texturas e o prazer de partilhar bons momentos em torno dele, que o resto os ginásios e as lavandarias se encarregarão de apagar.
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