9.2.11

beijos escritos

Consta que, nos primórdios da descoberta pelo povo desse interessante objecto que é o telemóvel, isto é, quando a coisa se tornou de tal modo comum que mais do que cinco dos conhecidos de cada um de nós passaram a ser ostensivos possuidores do dito bicho, se vulgarizou a troca de mensagens curtas, vulgo sms. Visto que as operadoras estabeleceram como limite máximo de caracteres para cada sms o interessante número de 140 (que deve ser mítico, já que é o mesmo estabelecido para os mais modernos tweets), e visto que os primitivos aparelhos apenas permitiam o envio de um sms de cada vez, o povo rapidamente percebeu que poderia poupar trabalho e uns tostões se abreviasse certas palavras. E assim se propagou a castradora moda de suprimir as vogais.

Um dos desgraçados termos que passou a ser alvo das abreviaturas foi a palavra "beijos" que, provavelmente por, regra geral, ser a última palavra a ser escrita, rapidamente deu lugar a um curtíssimo "bjs". Uma pena.

Escrever "beijos" jamais será igual a dá-los. Por muito escritos que estejam, não há letras que substituam o contacto entre a pele do destinatário e os lábios do remetente da mensagem. Logo, escrever "beijos" já é, por si só, limitado nos efeitos. Abreviar o termo torna a coisa ainda mais escassa. Não são dados, mas também já nem sequer são escritos: são tão-somente abreviados, compactados em três caracteres, muito apertadinhos, muito pequeninos, muito desenxabidos.

Por isso, sempre fui muito resistente ao uso desta pseudo-expressão, em particular. A princípio, porque "bjs" me sabia a pouco. Depois, progressivamente, fui desenvolvendo uma aversão à abreviatura porque passei a vê-la como um gesto de quem não está muito preocupado no modo como se despede, de alguém que beija mas de fugida, à pressa, desleixadamente e se há momento confrangedor e desagradável é o da despedida apressada, o do beijo atirado à sorte, o do acenar de costas voltadas.

Felizmente, à medida que eu e os meus fomos acrescentando anos à idade, deixámos de usar esta abreviatura, quero crer, porque passámos a ser mais sensíveis ao modo como terminamos os "encontros via sms", porque passámos a dar mais importância ao remate dos contactos que estabelecemos, porque passámos a ser mais atenciosos com os destinatários dos nossos escritos.

Por isso, não é senão com estranheza que vejo que há quem, tendo mais do que quinze anos, insista em utilizar a abreviatura. Pior do que isso: que há quem, tendo mais do que quinze anos, use a abreviatura nos sms que manda de borla, nos e-mails, nos comentários de blogues ou do Facebook, ou seja, em circunstâncias onde deixou de justificar-se a poupança de caracteres. Sendo que não se aplica o critério da racionalidade económica, só pode explicar-se o "bjs" por preguiça, por conformismo ou por desleixo, tudo coisas que, se ainda vamos tolerando nos adolescentes, já não temos tanta pachorra para aceitar na malta mais crescidinha.

Pela minha parte, nos escritos que me são dirigidos, prefiro mil vezes que não escrevam nada do que escrevam "bjs". Ao fim e ao cabo, o efeito é o mesmo: é tão insípida uma mensagem selada com aquela abreviatura como uma mensagem em que o remetente nada diz. Porque um "bjs" não é uma despedida, não é um beijo, não é nada, é uma trapalhada metida à pressa que eu, nesta fase da vida, não só dispenso bem como rejeito veementemente.

Ainda que seja por escrito, gosto de ser beijada com cuidado, com ternura, com atenção. É que, mesmo por escrito, não me beija quem quer, beija apenas quem eu deixo e, para isso, tem de beijar nada mais, nada menos do que muito, muito bem.

© [m.m. botelho]

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