Acho que se voltar a ler num blogue um apelo para ir votar no próximo Domingo, vomito. Eu até compreendo que nos blogues ditos "políticos" se façam esses apelos, se apresentem declarações de voto e se faça propaganda por um determinado partido. Já num blogue que não tenha essa característica vincada, que sentido faz estar ali a apregoar «vão votar», como se disso dependesse a própria sobrevivência? E qual é o interesse do leitor em saber que o Autor do blogue "X" (que é, por hipótese, de cariz literário, pessoal ou desportivo), vai votar neste ou naquele partido? Acaso saber o sentido de voto dos outros influencia o meu? Bem, o meu não influencia, mas se calhar até influencia o de uns quantos patetas que não sabem destrinçar a admiração que se tem por uma pessoa numa determinada área, do seguidismo que se pode ou não fazer das suas convicções políticas. Por exemplo, eu tenho o maior respeito e admiração intelectual e académica pelo Professor Doutor Gomes Canotilho, mas não partilho da sua ideologia política, logo, por muito que ele me dissesse «vou votar no partido "Y"», eu não votaria no partido "Y". Daqui se conclui que, se alguém votar no partido "Y" só porque "A" vota no partido "Y", fá-lo porque não passa de um grande nabo que não tem consciência de que o voto é um acto individual.
Assim sendo, só compreendo estas declarações de voto de gente que nem sequer está ligada à política como uma qualquer necessidade de afirmação de que se faz parte deste ou daquele grupo (os que votam "naquele" partido). E essa necessidade de afirmação vem de onde? Será da importância que dão a sentirem-se identificados com as figuras públicas que também votam nesses partidos? É uma hipótese, mas Freud que explique, que eu não tenho interesse ou conhecimentos para tanto e, em boa verdade, também não tenho tempo para me dedicar a analisar a vida dos outros, que a minha já me dá o que fazer.
O que acho tremendamente curioso é que as pessoas que muito apelam ao voto são precisamente aquelas que, provavelmente, já falharam o dever cívico noutros actos eleitorais. Fazem-me lembrar aqueles sujeitos que nunca tomaram vitaminas na vida e um dia vão ao médico, que lhes receita uma embalagem de «Centrum». É ouvi-los, a partir de então, a recomendar «Centrum» a toda a gente, como se não tomar «Centrum» fosse um pecado. Com o voto passa-se mais ou menos o mesmo. Um dia acordam e descobrem que faz todo o sentido ir votar, principalmente agora, neste momento, por causa da crise e tal e tal. Tal como um dia acordaram e perceberam que, como estavam em crise, tinham de poupar, mas só porque estavam em crise.
O português-médio é assim: nos momentos especialmente delicados vota; quando a crise aperta, tenta poupar (a maior parte nem consegue poupar porque não tem por onde), quando troveja, invoca Santa Bárbara. Mas só faz uma coisa quando sucede a outra, caso contrário, vive «pobrete, mas alegrete».
Às vezes questiono-me se aquela gente que vai para as televisões dizer que agora leva a refeição de casa para comer no trabalho só descobriu no século XXI a existência das marmitas e dos «Tupperwares», do mesmo modo que me interrogo se esta gente que agora apela ao voto em cada post que escreve só descobriu agora que existem actos eleitorais e que votar é um dever cívico.
Não há pachorra para esta gente. Se estivessem caladinhos faziam melhor figura. Assim só mostram que não passam de uns acomodados que só se levantam da cadeira para ir fazer alguma coisa quando a casa já está a arder. E uma pontinha de vergonha na cara, não? Oh, não, isso é só quando for absolutamente necessário. Até lá, deixa arder que o FMI é bombeiro e a abstenção é rainha. Não há pachorra.
[Nota: o título deste post é uma adaptação livre feita por mim de um conhecido verso de Álvaro de Campos.]
© [m.m. botelho]
Assim sendo, só compreendo estas declarações de voto de gente que nem sequer está ligada à política como uma qualquer necessidade de afirmação de que se faz parte deste ou daquele grupo (os que votam "naquele" partido). E essa necessidade de afirmação vem de onde? Será da importância que dão a sentirem-se identificados com as figuras públicas que também votam nesses partidos? É uma hipótese, mas Freud que explique, que eu não tenho interesse ou conhecimentos para tanto e, em boa verdade, também não tenho tempo para me dedicar a analisar a vida dos outros, que a minha já me dá o que fazer.
O que acho tremendamente curioso é que as pessoas que muito apelam ao voto são precisamente aquelas que, provavelmente, já falharam o dever cívico noutros actos eleitorais. Fazem-me lembrar aqueles sujeitos que nunca tomaram vitaminas na vida e um dia vão ao médico, que lhes receita uma embalagem de «Centrum». É ouvi-los, a partir de então, a recomendar «Centrum» a toda a gente, como se não tomar «Centrum» fosse um pecado. Com o voto passa-se mais ou menos o mesmo. Um dia acordam e descobrem que faz todo o sentido ir votar, principalmente agora, neste momento, por causa da crise e tal e tal. Tal como um dia acordaram e perceberam que, como estavam em crise, tinham de poupar, mas só porque estavam em crise.
O português-médio é assim: nos momentos especialmente delicados vota; quando a crise aperta, tenta poupar (a maior parte nem consegue poupar porque não tem por onde), quando troveja, invoca Santa Bárbara. Mas só faz uma coisa quando sucede a outra, caso contrário, vive «pobrete, mas alegrete».
Às vezes questiono-me se aquela gente que vai para as televisões dizer que agora leva a refeição de casa para comer no trabalho só descobriu no século XXI a existência das marmitas e dos «Tupperwares», do mesmo modo que me interrogo se esta gente que agora apela ao voto em cada post que escreve só descobriu agora que existem actos eleitorais e que votar é um dever cívico.
Não há pachorra para esta gente. Se estivessem caladinhos faziam melhor figura. Assim só mostram que não passam de uns acomodados que só se levantam da cadeira para ir fazer alguma coisa quando a casa já está a arder. E uma pontinha de vergonha na cara, não? Oh, não, isso é só quando for absolutamente necessário. Até lá, deixa arder que o FMI é bombeiro e a abstenção é rainha. Não há pachorra.
[Nota: o título deste post é uma adaptação livre feita por mim de um conhecido verso de Álvaro de Campos.]
© [m.m. botelho]